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segunda-feira, 20 de agosto de 2012

ENTREVISTA: MAURO ALENCAR - UM SUPER-ESPECIALISTA EM TELENOVELAS


Mauro Alencar é considerado o maior especialista em teledramaturgia do Brasil. Autor de muitos livros sobre o assunto, entre eles, "A Hollywood Brasileira: Panorama da Telenovela no Brasil", e da série "Grandes Novelas", onde adaptou histórias clássicas da TV para o formato de livro, ele está sempre participando de seminários e congressos sobre o tema. Mauro Alencar é mestre e doutor em teledramaturgia brasileira e latino-americana pela USP e possui um vasto material sobre o tema. Transformou a sua paixão pela telenovela em seu trabalho e entre suas muitas atividades profissionais, está a de consultor e pesquisador da Rede Globo, entre outras. Seu conhecimento sobre teledramaturgia o torna muito requisitado em palestras, programas de TV e entrevistas. Sempre muito atencioso, Mauro Alencar conseguiu um espaço para responder essa entrevista para o "Super TV e Mais!", apesar de seu tempo muito corrido. É uma grande honra para mim e para o blog publicar uma entrevista com um super-especialista como ele. Espero que os fãs da nossa teledramaturgia aproveitem a entrevista, onde ele fala um pouco sobre seu trabalho, sobre sua paixão por novelas e sobre seus próximos projetos, que incluem um livro sobre a vida do grande ator Paulo Gracindo, entre outros assuntos. Confiram:

SUPER TV E MAIS! - Sei que você já deve ter respondido isso inúmeras vezes em outras entrevistas, mas não podia deixar de te perguntar como surgiu a sua paixão pelas telenovelas.

MAURO ALENCAR - Para ser bem exato, minha paixão por teledramaturgia teve início com o seriado Perdidos no Espaço. Nesse período, a TV Excelsior exibia algumas novelas que chamavam a minha atenção: RedençãoA MuralhaSangue do Meu Sangue e Os Estranhos. Em 1970, a Rede Globo produziu Irmãos Coragem.  Eu brincava de Forte-Apache e a novela era um verdadeiro faroeste. Para mim, era tudo igual. A novela e o brinquedo se misturavam. Na sequência, fascinou-me O Cafona, que lançou a primeira trilha sonora produzida pela Som Livre. Foi também o meu primeiro “disco adulto”. Ganhei de presente quando fiz nove anos. Tornei-me grande admirador de Francisco Cuoco.

SUPER TV E MAIS! - Além das novelas brasileiras você já acompanhou alguma novela de outro país, por exemplo as famosas mexicanas do SBT? Quais são as principais diferenças de estrutura que você destaca entre as novelas brasileiras e estrangeiras?

MAURO ALENCAR - Claro que sim. Faz parte do meu trabalho. Comparando nossas tramas com as telenovelas mexicanas, as diferenças de produção, interpretação e texto são muitas. Nossas novelas costumam ter mais capítulos (160 a 221) e grandes elencos, com várias histórias paralelas. Já as produções mexicanas contam com elenco reduzido e tramas menores (geralmente de 100 a 150 capítulos). Além disso, os mexicanos sempre tiveram grande interesse em produzir remakes de seus maiores sucessos. No Brasil, tal procedimento ganhou fôlego nos últimos anos, mas já sofreu resistência e preconceitos. Em termos de conteúdo dramatúrgico, a produção brasileira está ancorada na evolução social; em particular a partir de 1970 quando a Rede Globo de Televisão iniciou o processo de modernização e industrialização do gênero. Reside exatamente aí um dos maiores e mais marcantes diferenciais da telenovela brasileira em relação às produções estrangeiras; particularmente a mexicana.    

O seriado "Perdidos no Espaço" e a novela "Irmãos Coragem" foram muito marcantes para Mauro Alencar.

SUPER TV E MAIS! - Na década de 1960 as novelas brasileiras tinham como modelo as histórias latinas cheias de drama, sendo uma das mais lembradas, "O Direito de Nascer" (1964). Só no final daquela década, com "Beto Rockfeller" (1968) é que a telenovela foi adquirindo uma identidade mais brasileira. O que foi determinante para essa mudança de estilo?

MAURO ALENCAR - Além da busca por novas estéticas e linguagens, a televisão da década de 1960 incorporou muitos autores de teatro, como Dias Gomes, Bráulio Pedroso, Lauro César Muniz, entre outros. Nada mais natural que houvesse uma conjunção de características entre teatro e TV, propiciando novos ares à teledramaturgia. Certamente o ponto de partida para a mudança de estilo é creditado à inquietação de Cassiano Gabus Mendes, então diretor artístico da TV Tupi, farto que estava de tramas alheias ao universo nacional. E o que determinou de maneira completa a mudança de estilo foi o alto investimento da Rede Globo de Televisão no gênero. O resultado é que em 1970 começa a Moderna Telenovela Brasileira.

SUPER TV E MAIS! - As telenovelas foram bastante perseguidas pela Censura nas décadas de 1970 e 80. Hoje não há censura, mas a atual classificação indicativa é bem rígida e impõe várias regras do tipo de cena que pode ou não ir ao ar em cada horário. Como você vê isso? Na sua opinião houve algum tipo de retrocesso na telenovela que se faz hoje em comparação com a que se fazia na década de 1990?

MAURO ALENCAR - Tudo o que se veicula em mídias de grande alcance passa por adequações de horário, faixas etárias, temas, etc. É um processo natural e o papel da família na formação do telespectador é muito mais interessante que as restrições da classificação indicativa. Sobre a questão da telenovela hoje, acredito que cada época tem os seus paradigmas e, por isso, um modelo diferente de novelas. Se consideramos que houve retrocesso nas telenovelas, isso significa também que precisamos repensar os caminhos de nossa sociedade...

SUPER TV E MAIS! - Como você explica o fascínio que a telenovela sempre exerceu no público?

MAURO ALENCAR - O fascínio do público pela telenovela origina-se na necessidade do ser humano por consumir ficção. Acompanhar uma história fictícia é uma atividade social desde os mais remotos tempos, com a narração de grandes feitos, por exemplo. Contar e acompanhar sistematicamente histórias de ficção é intrínseco ao ser humano, é um compartilhar social que, a despeito das diferenças de cada um, faz com que nos sintamos  parte de um todo.

"O Direito de Nascer" (1964) e "Beto Rockefeller" (1968): duas novelas clássicas, dois momentos da história da telenovela brasileira na TV Tupi.

SUPER TV E MAIS! - Quais as principais contribuições que a telenovela traz para o público ao adaptar uma obra literária ou discutir algum tema importante para a sociedade?

MAURO ALENCAR - A televisão consegue estabelecer um amplo diálogo com a sociedade. Este fenômeno acontece no Brasil e em muitos outros lugares, como na América Latina em geral. Adaptar uma obra literária ou discutir um tema importante na televisão é colocar em pauta informações valiosas nesse diálogo com o público, e a telenovela é um dos melhores veículos para tal.


SUPER TV E MAIS! - A audiência das telenovelas atuais caiu bastante em comparação com as mais antigas. Muitos atribuem isso às novas mídias como TV por assinatura e internet. Há ainda quem ache que o gênero sofreu um desgaste natural ao longo do tempo. Como você vê essa questão?

MAURO ALENCAR - A questão da audiência é muito complexa e envolve diversas questões, como, por exemplo, a metodologia para a medição (que mudou ao longo dos anos). Além disso, o que observo é que a audiência espalhou-se para outras plataformas de comunicação; ou seja, além do televisor, ela está cada vez mais presente em revistas, jornais, rádios, programas de televisão e nas novíssimas mídias do século XXI a partir da internet: sites, blogs, twitters, facebook, etc...  Portanto, não podemos analisar apenas os índices de audiência com base no veículo televisão. É preciso acompanhar os movimentos sociais, tecnológicos e saber que é muito importante o quê e o quanto se fala de uma determinada telenovela (caso, em especial, das atuais Avenida Brasil e Cheias de Charme, Amor Eterno Amor e Gabriela, por exemplo, presentes de maneira intensa em todas as mídias que citei acima). Portanto, os desdobramentos em termos de audiência seguem muito satisfatórios desde os tempos de O Direito de Nascer, passando por Selva de Pedra, O Bem-Amado, O Astro, Roque Santeiro, Vale Tudo, A Próxima Vítima,O Rei do Gado, Por Amor...  até os dias de hoje.
Sintetizando e finalizando: há que se redimensionar a telenovela com a sociedade informatizada da contemporaneidade. A partir daí, verifica-se que não houve queda alguma de audiência.          

SUPER TV E MAIS! -Quais são os seus autores e suas novelas preferidas, aquelas que ficarão marcadas para sempre na memória do público e na história da televisão brasileira?

MAURO ALENCAR - Acompanho sistematicamente a todas as novelas desde 1970; portanto a lista seria imensa, pois a cada década encontraremos novelas e autores que marcaram a memória do público e a história da televisão brasileira.   

"Cordel Encantado" e "Avenida Brasil": duas das novelas citadas por Mauro nessa entrevista.

SUPER TV E MAIS! - As reprises de novelas mais antigas do Canal Viva são um grande sucesso. Até a Globo reprisou "Mulheres de Areia", folhetim de quase 20 anos atrás. Você acha que o público está mais nostálgico? Considera as novelas antigas melhores do que as atuais?

MAURO ALENCAR - Não, o público sempre desejou rever boas tramas, independente da época. Caso você retome a seção de cartas de telespectadores publicadas em jornais da década de 90, por exemplo, lerá muita gente pedindo reprises de novelas como O Espigão (1974) e Baila Comigo (1981). O que acontece é que hoje há uma memória televisiva melhor cuidada e instrumentalizada. Desse modo, temos maiores chances para trabalhar corretamente com ela, inclusive em reprises.


SUPER TV E MAIS! - Muitas pessoas se queixam da longa duração e do esticamento das novelas. Autores como Lauro César Muniz defendem novelas mais curtas de 120 a 140 capítulos, dizendo que todos saem ganhando com as novelas de duração menor. Qual a sua opinião sobre esse assunto?
 
MAURO ALENCAR - O interessante, na minha opinião, é a alternância entre telenovelas longas e curtas ou, ainda, ter o número de capítulos necessários para a trama que o autor deseja contar. Portanto, vale registrar que tanto a primeira versão de Selva de Pedra, com 243 capítulos, como Escrava Isaura, contada em 100 capítulos na versão original da Globo, tornaram-se os maiores clássicos de todos os tempos. Do mesmo modo, Cordel Encantado e Avenida Brasil.


SUPER TV E MAIS! - Você é considerado o maior especialista em teledramaturgia no país. Quais são os principais materiais sobre a telenovela que você possui? Como é a sua rotina de trabalho?

MAURO ALENCAR - Basicamente, meu acervo começou com trilhas sonoras em vinil, capítulos gravados em fita cassete e VHS,  recortes de revistas e jornais, além de livros com teoria e história da telenovela. Atualmente, minha rotina de trabalho é bastante dinâmica e diversificada, dependendo exclusivamente dos projetos nos quais estou inserido: consultoria, pesquisa, aulas, palestras, livros, entrevistas, participação em congressos, seminários...

Mauro Alencar possui um grande acervo sobre a telenovela.

SUPER TV E MAIS! - Você consegue acompanhar todas as novelas que estão sendo exibidas atualmente? Quais são suas preferidas no momento?

MAURO ALENCAR - Acompanhar novelas é meu ofício. Neste momento, posso afirmar com absoluta sinceridade que tenho grande interesse por todas as tramas veiculadas.


SUPER TV E MAIS! -  Você escreveu vários livros, entre eles o famoso "A Hollywood Brasileira: Panorama da Telenovela no Brasil". Depois, vieram a coleção Grandes Novelas e a biografia da Nívea Maria, na coleção Aplauso. Há planos para mais livros?

MAURO ALENCAR - Sim, há algum tempo estou desenvolvendo com Gracindo Junior a biografia do ator Paulo Gracindo, a ser publicada em breve.


SUPER TV E MAIS! - O que mais funciona e o que costuma dar errado em uma telenovela? O público prefere novelas de estilo mais clássico ou tramas mais inovadoras?

MAURO ALENCAR - Muita coisa pode ser tentada dentro da telenovela. Que Rei Sou Eu? (1989) e Cordel Encantado (2011) são tramas muito ousadas e trouxeram novidades para o público. O que, em hipótese alguma, deve ser feito por um novelista é rechaçar o gênero. Respeitando-se as características fundamentais da telenovela, pode-se escrever inventivas histórias.

"A Hollywood Brasileira", um dos livros mais conhecidos e importantes sobre a telenovela no Brasil.


SUPER TV E MAIS! -  Entendendo tanto sobre teledramaturgia, você nunca pensou em escrever uma novela?

MAURO ALENCAR - Acredito que cada pessoa segue seus próprios passos, trilha os caminhos que vai encontrando pela frente, conta sua própria história. A minha história, até o momento, é esta.


SUPER TV E MAIS! -  A telenovela completou 60 anos. Ela ainda tem fôlego para mais 60 anos? Como você acha que será o futuro da telenovela?

MAURO ALENCAR - Sim, tal como o teatro, o romance, o cinema e tantas outras formas que preenchem um único objetivo: contar uma boa história. Quanto aos próximos 60 anos da telenovela, qualquer coisa que eu diga aqui será mera especulação, o que não deixa de ser estimulante. Por ora, resta-nos aguardar as cenas dos próximos capítulos.


Um comentário:

  1. a proxima novela vale apena ver de novo podia ser..celebridades...ou belíssima....ou pagina da vida..

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