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quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

BALANÇO DE "A VIDA DA GENTE"


Essa semana a novela "A Vida da Gente" se despede da telinha. A primeira novela de Lícia Manzo foi uma grata surpresa na teledramaturgia. A novela teve muitos altos e baixos, mas pode-se dizer que seu saldo é positivo de modo geral.

Desde o início foi muito comentado a semelhança de estilo entre Lícia Manzo e Manoel Carlos. De fato o texto da autora é de uma sensibilidade e realismo admirável. Assim como nas novelas de Maneco, em "A Vida da Gente", as relações são muito humanizadas e próximas da vida real. O título da novela caiu como uma luva porque todas as situações mostradas poderiam acontecer com qualquer ser humano. Na novela não há uma mocinha e um vilão tradicionais, ninguém é só bom ou só mal. Todos tem qualidades e defeitos. Aliás o que não faltou em "A Vida da Gente" foram personagens com seus defeitos explorados ao extremo. Mesmo os protagonistas foram mostrados com suas virtudes e erros.

Lícia Manzo contou sua história com uma grande habilidade ao mostrar a complicada relação das irmãs Ana (Fernanda Vasconcellos) e Manuela (Marjorie Estiano) sem transformar nenhuma delas na vilã ou na vítima. Isso criou um conflito no público, que não sabia direito por quem torcer, porque ambas tiveram erros e acertos ao longo da novela.


Substituir uma novela que foi  sucesso de público e crítica como "Cordel Encantado" não é uma tarefa fácil, mas Lícia soube dar conta do recado direitinho. Logo em sua primeira novela a autora teve de enfrentar o temido horário da verão, que é a principal pedra no sapato das novelas das seis. Além disso, o desempenho ruim de "Malhação" também prejudicou um pouco a novela, que acabou não repetindo o sucesso de "Cordel Encantado", mas quando analiso esses fatores penso que a audiência não foi tão ruim assim e que a novela cumpriu sua missão, mantendo a atenção de um público fiel do início ao fim.

Os destaques de "A Vida da Gente" são muitos. Nem preciso falar do ótimo texto de Lícia Manzo e da direção inspirada de Jayme Monjardim. Ana Beatriz Nogueira deu um show de interpretação na pele da inconsequente Eva, que superprotegia e sufocava Ana, a filha mais nova, enquanto desprezava Manu, a mais velha. Apesar de muito amarga, Eva não foi apresentada como uma vilã e apesar de nos revoltarmos um pouco com algumas de suas atitudes, acabamos compreendendo e até gostando dela, que é uma das melhores personagens da novela. Nicette Bruno como sempre, arrasou na pele da vovó Iná, que estava sempre do lado das netas. Ela e Stenio Garcia formaram um casal muito bonito e a autora discutiu através deles o sexo na terceira idade, de maneira sutil e delicada. 

Através da personagem Moema (Cláudia Mello), que depois dos 50 e tantos anos resolve entrar para a faculdade e realizar o sonho de ser enfermeira,  a autora mostrou que nunca é tarde para correr atrás de um grande sonho. Outro tema interessante mostrado na novela foi a inversão de papéis entre um homem e uma mulher, através de Vitória (Gisele Fróes) e Marcos (Ângelo Antonio). No início da novela era ela quem trabalhava fora e sustentava a casa, enquanto ele cuidava da casa e das filhas.

Fernanda Vasconcellos e Marjorie Estiano mostraram mais uma vez porque são consideradas duas ótimas atrizes da nova geração. A interpretação das duas melhora mais a cada novela  e me arrisco a dizer que elas fizeram suas melhores personagens até agora nessa novela. Rafael Cardoso em seu primeiro protagonista também mostrou muita segurança e competência. Sem dúvida um grande ator que surgiu há pouco tempo, mas já deu provas de seu talento e tem potencial para ir muito longe ainda. Maria Eduarda no papel da imatura e divertida Nanda,  foi ótima nessa novela e suas cenas foram as que transmitiram mais leveza e alto-astral. Também não dá para deixar de falar de Gisele Fróes, que nos presenteou com uma excelente atuação na pele da rígida treinadora Vitória. Ela e Francisco Cuoco, que entrou na metade da novela, mostraram uma grande sintonia em cena. Thiago Lacerda interpretou Lúcio, um personagem diferente de tudo o que já havia feito, e também merece destaque.

        

A ambientação da novela está de parabéns. Lícia Manzo escolheu as cidades de Porto Alegre e Gramado no Rio Grande do Sul, cenário pouco explorado nas novelas da Globo, que em sua maioria são ambientadas no Rio de Janeiro ou São Paulo. Foi bom ver uma novela em outra região.

Mas nem tudo foi perfeito em "A Vida da Gente". O ritmo da novela sempre foi muito lento, principalmente no período em que Ana ficou em coma. A novela ficou um pouco parada e meio cansativa do capítulo 15 ao 50 e só depois da volta de Ana, as coisas entraram nos eixos, mas mesmo assim houve muitos capítulos sem grandes novidades, em que pouca coisa de relevante para a história acontecia. A novela também foi acusada de ser muito depressiva e angustiante, mas isso é exagero na minha opinião. Cada autor tem o seu estilo e quem acompanhou a novela desde o início, sabe que houve muitos momentos divertidos e que nem tudo foi só drama.

Também acho que as relações entre alguns personagens poderiam ter sido melhor exploradas. Por exemplo: Jonas (Paulo Betti) se afastou dos filhos Rodrigo e Nanda no início da novela e depois disso não houve mais qualquer reaproximação entre eles. Jonas nunca conheceu nem a neta Júlia (Jesuela Moro) e também nunca reencontrou a ex-mulher Eva. Também podia ter havido mais conflitos entre Vitória e Alice (Sthefanie Brito), a filha que ela abandonou ainda bebê e que foi criada pelo casal Cícero (Marcelo Airoldi) e Susana (Daniela Escobar). Teria sido muito interessante um conflito entre Vitória e os pais adotivos de Alice, mas os personagens nunca se encontraram. Também acho que o casal Cícero e Susana não teve o destaque merecido. Os dois só começaram a aparecer mais já na reta final da novela. A novela teve um número reduzido de personagens, mas eles ficavam cada um no seu canto. Faltou amarrar mais a trama e fazer os personagens se encontrarem mais uns com os outros.

Além de tudo, vários telespectadores disseram que a novela era feminina demais, que os homens de "A Vida da Gente" eram uns fracos, mas não acredito que tenha sido intenção da autora fazer a novela dessa forma. Simplesmente aconteceu de ela criar muitas personagens femininas fortes na mesma história o que deu a impressão errônea de que todos os homens ficavam à sombra das mulheres, mas basta examinar bem a novela para ver que isso não é intencional.


A autora da novela, Lícia Manzo

Entre as cenas inesquecíveis de "A Vida da Gente", merecem destaque o acidente de Ana, e a cena do acerto de contas entre Ana e Manuela, quando ambas se acusam mutuamente por os erros que cometeram. Essa é a melhor cena da novela até agora. O que nos resta  é acompanhar as últimas emoções da trama, que com certeza serão repletas de cenas para ficar na memória.

Concluindo: Lícia Manzo mostrou que é uma excelente autora e criou uma boa novela, simples e despretensiosa que vai deixar saudades em quem acompanhou. Personagens como Ana, manu, Eva e dona Iná ficarão por muito tempo na nossa memória. "A Vida da Gente" é daquelas novelas da qual guardaremos sempre uma boa recordação.  Lícia Manzo e toda a equipe da novela estão de parabéns!









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